A infância é realmente uma construção de sonhos, de ilusões. A vida, para as crianças, é feita de castelos e fantasias. A felicidade total está na perspectiva de alcançarem a idade adulta e então fazerem tudo o que querem: não tomar mais banho, como diz meu filho, comer todos os chocolates e sorvetes possíveis, comprar brinquedos indefinidamente, não ter mais pai ou mãe para obedecer,
estudar somente quando estão com vontade, ter o maior chulé do mundo, só assistir televisão, dormir até bem mais tarde, não ter horário para nada, ir nos locais mais fundos da piscina mesmo sem saber nadar, arrotar e flatular na mesa sem censuras, entupir-se de pizza e cheese burger e por aí vai. A lista pode ser infindável!
Crescer e ser “gente grande” é um dos ideais da infância que embute em si mesmo toda uma perspectiva positiva quanto ao que consiste ser uma pessoa adulta. O mundo dos adultos é um mundo perfeito, é o palco da justiça, da ética e da liberdade.
Imagino o quanto as crianças nos colocam num pedestal ... nós, pais, principalmente. Somos poderosos para eles: sabemos tudo, não erramos nunca, temos a sapiência de sempre discernir as atitudes corretas e as negativas. Como se não bastasse isso somos o protótipo dos mais nobres ideais e valores: honestos, trabalhadores, leais, solidários, altruístas, estudiosos, asseados, sem preguiça, saudáveis e ainda por cima, lindos de morrer. Somos sempre os melhores em tudo! ... até chegar a adolescência deles, momento em que a nossa máscara vai sendo tirada e começamos a ser vistos como pessoas “normais”, cheias de defeitos. As instituições passam a ser questionadas, tudo é passível de ressalvas e de “graves defeitos”. A princípio, são contra, talvez mais para tentar dar consistência à própria identidade, ávida de sedimentar-se frente os senões adultos.
De qualquer forma, por mais que o adolescer vire uma página importante de desmonte de “castelos”, o livro não se fecha. Nos tornamos adultos, pretensamente caímos na “real” mas não cansamos de nos decepcionar com as pessoas, as instituições, o sistema econômico, os jogos de poder e conosco mesmo. As ilusões permanecem. Por quê tudo têm que continuar sendo tão perfeito no nosso imaginário e ao mesmo tempo tão inviável? Será uma sabedoria transcendental, inerente aos mistérios, que torna necessária a manutenção dos sonhos infantis na cabeça de todos nós para que possamos suportar a crueza do viver?
Será que a maturidade da velhice nos brindará com a virtude de esperar de tudo tão pouco como se fosse tudo?
Por: Návia T. Pattussi/Psicanalista/naviat@terra.com.br
Fonte: MARCOS A. BEDIN
MB Comunicação Empresarial/Organizacional
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