2 de janeiro de 2010

A encabulada deve ser a mulher?

Para ser perfeita, a mulher devia imitar o exemplo das atrizes de cinema. Bem, não de todas, é claro, pois se uma moça andasse pelas ruas tal como Martine Carol aparecia em certos filmes seria um escândalo. Digna de ser imitada eram Dóris Day, ou, mais modestamente, Ilka Soares, de quem dizia a revista Manchete, em março de 1953: “Morena cor de jambo, de olhar azul celeste, cabelos ouro cacau e lábios de açafrão-fogo-mel, esse broto carioca tem boa voz, elegância, doçura e sabor de uva”.

Essa autêntica salada de frutas era a nova versão da Virgem dos lábios de mel. Aliás, Ilka fizera sua estréia no cinema, aos 15 anos, trabalhando justamente em Iracema, em 1948. É certo que aparecera nuilkasoaresa nesse filme, numa cena de banho no rio, na qual imitava Heddy Lamar em Êxtase. Mas o tempo havia passado e agora, em 1953, seu noivado com Anselmo Duarte era mostrado como um modelo a ser seguido. Os ternos beijos trocados pelo casal eram apresentados pela revista Manchete como “bem diferentes das fortes cenas de amor que os tão conhecidos artistas do cinema nacional viveram nas telas”.

Casar continuava a ser o verbo supremo que toda adolescente devia conjugar. Sobretudo, casar virgem. Pelo menos, assim pensavam os mais velhos. A questão estava em como agradar os homens. “ Os rapazes gostam de pequenas que saibam animar uma palestra”, opinava Tia Marta, em 1951, na revista A Cigarra, “mas odeiam as garotas que falam muito. Se ela usa cores alegres, bastante maquilagem e chapéus audaciosos, ele hesita em sair com ela. Se ela usa um tailleur e uma boina escura, ele sai com ela mas passa o tempo todo olhando as que usam cores alegres, bastante maquilagem e chapéus audaciosos”.

Ainda em 1958, escrevia Maria Luiza na seção Garotas da revista O Cruzeiro, condenando os excessos de carinho feminino em público: “Por mais que se tenham modificado as regras do jogo, do tempo das cavernas para cá, ainda está de pé aquela que declara que a encabulada deve ser a mulher”. Eis aqui um mundo de preconceitos herdados das décadas anteriores a respeito de como devia se comportar uma mulher.

Os tabus ainda eram muitos. Fazia-se propaganda de Modess, mas evitava-se a palavra menstruação. A mulher devia pintar o rosto, sobretudo os lábios, e fazer permanente nos cabelos para parecer bela. Divórcio? Nem pensar. Mulher desquitada era malvista, convinha evita-lá. Mas os padrões de comportamento estavam mudando. As mocinhas já não suspiravam por Clark Gable ou Robert Taylor.

Em 1953, O Selvagem,  com Marlon Brando, trazia um novo tipo de herói, o jovem marginalizado e violento. Dois anos depois, James Dean seria o porta-voz dos rebeldes sem causa. As garotas começavam a andar de calça comprida e a aceitar carona em automóveis ou em garupas de lambretas. E já não dançavam ao som dos boleros que haviam enlevado suas mães. Um novo som explodia, marcando o ritmo da nova época. Era o rock-and-roll.

Fonte de pesquisa: Nosso Século, Abril Cultural, 1980/1982.

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3 comentários:

  1. Muito boa matéria, a revolução cultural tem demonstrado que esses valores vem se modificando ao longo do tempo e no meu ver rápido demais.
    Abraços forte

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  2. Confesso que li "A Cigarra", "Manchete" e "O Cruzeiro", mas não em 1953. Em 1958 pode ser que tenha visto...
    Como os tempos mudaram, Não é mesmo?

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  3. Tudo muda ..... mas, as mulheres não mudaram tanto .... RsRsRs

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